quarta-feira, 22 de abril de 2015

Advogado tatuado... pode?

Tatuagens e suas implicações para os profissionais do Direito

Publicado por Camila Arantes Sardinha - 1 dia atrás
Advogado tatuado pode
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Tatuagens são um grande tabu, sobretudo em meios como o do Direito, conhecido por seu caráter conservador e tradicionalista.
Frequentemente esse assunto vem à tona, sendo que para muitas pessoas permeia a dúvida se seria um empecilho para exercer a advocacia ou cargo público no âmbito jurídico ter uma parte do corpo tatuada
Primeiramente, cumpre salientar que existe uma diferença entre a advocacia, que por mais que possua utilidade pública e função social, é uma atividade privada, e um cargo público, cujos requisitos podem ser determinados por edital, mas não há a necessidade de captação de clientes.
O caráter de função pública da advocacia sugere, ainda que implicitamente, que o advogado esteja de acordo com a moral e os bons costumes. Como já abordado em outros textos deste blog, a imagem do advogado é seu cartão de visitas.
Uma quantidade considerável de clientes espera, ainda que inconscientemente, encontrar o advogado vestido de terno e gravata, com cara de pessoa experiente e estudiosa. Frequentemente ouvimos comentários como "nossa, mas você é advogado? Não parece", simplesmente porque não estamos vestidos "a caráter".
Sendo assim, uma tatuagem em um local muito visível pode, sim, atrapalhar profissionalmente o advogado, especialmente se o cliente for pessoa mais conservadora ou de mais idade.
Cristalina a presença de um pré-julgamento e preconceito (de pré conceito, conceito formado preliminarmente, sem análise dos fatos). Afinal, é óbvio que o fato de um advogado ser tatuado não influencia em absolutamente nada em seu profissionalismo e sua competência (no sentido de capacidade). Entretanto, quando lidamos com pessoas, é bom levarmos em consideração algumas cautelas, a fim de não nos prejudicarmos, já que a primeira imagem que passamos ao cliente pode ser muito mais importante do que imaginamos.
Eu tenho algumas tatuagens, mas nenhuma à mostra, exceto uma que fica na altura do punho. Essa eu sabia que poderia ser um problema na profissão (sobretudo porque meu pai trabalha muito com essa questão de imagem profissional e sempre me alertou para esse problema), mas por motivos pessoais a queria muito nesse local. Então é comum que, quando estou trabalhando, use um bracelete por cima, que cobre exatamente a área tatuada.
Como não possuo meios de saber se aquele cliente ou aquele juiz pode ter algum tipo de preconceito com a minha tatuagem no punho, já se tornou um hábito usar meu bracelete durante o horário de trabalho. Alguns colegas até brincam que é o "uniforme" de trabalho.
Entretanto, já me ocorreu que, em situações diversas das profissionais, como em reuniões familiares ou festas de amigos, alguém me indagou a respeito da tatuagem no punho e de "como os clientes confiam em um advogado tatuado?" ou "mas pode advogado ter tatuagem no braço?".
Certa vez, em uma festa de batizado, estava conversando com um senhor de cerca de 70 anos, e depois de muitas horas de conversa ele me indagou a respeito da minha profissão. Quando comentei que era advogada, ele se espantou e disse: "mas com tatuagem?".
Já ouvi explicitamente de muita gente que "sei que é bobeira, mas tenho preconceito contra gente tatuada". Então, infelizmente, sou forçada a admitir que tatuagem, ainda hoje, é um tabu. E que uma tatuagem muito grande ou muito visível pode, sim, atrapalhar sua vida profissional, ao menos na advocacia.
É bobeira? Sim. Mas é um fato e deve ser considerado.
De tal forma, não há uma proibição normativa a respeito de advogados tatuados, entretanto é aconselhável um pouco de cautela, uma vez que lidamos com gente, e preconceitos existem. Se você for um advogado jovem, pior ainda, já que além da tatuagem, não tem a mesma "cara" de experiência de um advogado mais velho. E se for mulher então, nem se fala.
Sendo assim, aqui vai um conselho meu (obviamente, fica a critério de cada um, e eu, particularmente, não veria problema em ser representada por um advogado coberto de tatuagens): se optarem por tatuar alguma parte do corpo, busquem ser discretos.
Você pode ter as costas cobertas por uma tatuagem enorme e, com roupa, ninguém verá, e nenhum cliente ou juiz jamais suspeitará. Para mulheres, tatuagens a mostra aconselho apenas se forem bem pequenas e discretas. A minha, por exemplo, não é tão pequena assim, sendo notória quando não estou usando meu bracelete. Por isso mesmo tive o cuidado de comprar um bracelete antes de fazer a tatuagem, e pedir ao tatuador que desse um jeito de fazê-la caber no espaço coberto pelo bracelete.
Nunca tive problemas com relação a isso (desde que usando o bracelete ou de manga comprida)!
Poder-se-ia aqui discutir a questão do preconceito contra advogados tatuados, e de como esse conceito de que pessoas tatuadas são avessas à moral e aos bons costumes é ultrapassado. Todavia, minha intenção neste texto é aconselhar os advogados, sobretudo em início de carreira, visando o Marketing Jurídico.
Obviamente, para os que desejam peitar o preconceito, mostrar as tatuagens é uma ótima opção. E para os que acham que um bom advogado não pode ser tatuado, eu poderia listar aqui uma séria de juristas renomados que são adeptos a tatuar o corpo.
Agora, quanto aos concursos públicos, em parte cabem as colocações feitas acima. Certamente para muita gente (e, novamente, em especial para pessoas de mais idade ou mais conservadoras), um juiz ou promotor tatuado causaria má impressão.
Entretanto, tanto o juiz quanto o promotor não precisam "captar" cliente, uma vez que exercem cargos públicos. O problema nesse caso seria outro: passar no concurso.
Com certeza todos nós já ouvimos falar que tatuagens podem ser motivo de exclusão de candidato a cargo público. E, claro, existem jurisprudências nesse sentido.
Todavia, o que observamos atualmente é uma progressão de ideias, e as jurisprudências recentes consideram que excluir candidato de concurso público em decorrência de tatuagens é uma regra preconceituosa.
Setores formais abrem espaço para tatuagens e outras expressões visuais., especialmente quando as tatuagens não são visíveis com roupa ou uniformes. Nesse sentido:
POLICIAL MILITAR. CONCURSO PÚBLICO DE INGRESSO NA CARREIRA. TATUAGEM. CONCURSO PÚBLICO. REPROVAÇÃO EM EXAME MÉDICO. Exclusão do candidato na etapa de exames médicos. Inaptidão que decorre da tatuagem. Não reconhecida. Tatuagem não expressa incompatibilidade com a função. Inocorrência de violação ao edital. Razoabilidade. A tatuagem não é visível com uso do uniforme. Inabilitação afastada.Precedentes jurisprudenciais. RECURSO PROVIDO. (TJ-SP - APL: 00177726020138260053 SP 0017772-60.2013.8.26.0053, Relator: José Maria Câmara Junior, Data de Julgamento: 27/08/2014, 9ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 27/08/2014) (grifo nosso).
E mesmo em casos de tatuagens visíveis, vemos jurisprudências contra a exclusão do candidato. Nesse sentido:
MANDADO DE SEGURANÇA. POLICIAL MILITAR. CANDIDATA COM TATUAGEM. Concurso público para provimento de cargo de Soldado PM da 2ª Classe. Candidata considerada inábil por possuir uma tatuagem entre a nuca e o pescoço. Inadmissibilidade. Tatuagem localizada em área que não se subsume às hipóteses elencadas no edital (Capítulo X, itens 8.2 a 8.2.2). Ademais, a imposição de critério de discrimen no edital de concurso público só se legitima em caráter excepcional e desde que esteja respaldado em lei (sentido formal), e como tal, sirva como forma de preservação do interesse coletivo e garanta maior eficiência ao serviço público. In casu, o fato de o candidato possuir tatuagem não atenta à ordem pública ou à honra da atividade a ser desenvolvida como policial militar. Desclassificação do certame que configura manifesto ato ilegal e afronta injustificada aos princípios da isonomia e da legalidade. Inteligência dos arts. , caput e inciso II37I, e 39§ 3º, todos da CF/88. Precedentes. Segurança concedida em primeira instância. Sentença mantida. Recursos não providos, o oficial considerado interposto.(TJ-SP - APL: 00169541120138260053 SP 0016954-11.2013.8.26.0053, Relator: Djalma Lofrano Filho, Data de Julgamento: 16/04/2014, 13ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 24/04/2014) (grifo nosso).
E ainda:
MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA MILITAR. TATUAGEM. INTELIGÊNCIA DA LC N. 587, DE 14-1-2013. INAPTIDÃO NO EXAME MÉDICO. DISCRIMINAÇÃO SEM JUSTIFICAÇÃO OBJETIVA E RAZOÁVEL. ORDEM CONCEDIDA. A liberdade de expressão, que encontra diversas formas de manifestação, constitui um dos fundamentos essenciais da sociedade democrática, uma das condições básicas para o seu progresso e para o desenvolvimento do ser humano, enquanto indivíduo. Traduz uma exigência do pluralismo, da tolerância e da grandeza de espírito sem os quais não há democracia. Evidente que, em matéria de liberdade de expressão, o Estado dispõe de alguma margem de apreciação. Mas as ingerências nesta liberdade exigem uma interpretação restritiva e devem corresponder a uma necessidade social imperiosa, devendo ser proporcionais ao fim a que se destinam. Tanto isso é verdadeiro que a Presidenta Dilma vetou disposição correlata da Lei n. 12.705, de 8 de agosto de 2012, a qual dispõe sobre os requisitos para ingresso nos cursos de formação de militares de carreira do Exército, que dispunha ser vedado o ingresso de candidato portador de tatuagem que, "pelas suas dimensões ou natureza, prejudiquem a camuflagem e comprometam as operações militares", aduzindo que "o discrímen só se explica se acompanhado de parâmetros razoáveis ou de critérios consistentes para sua aplicação" (Mensagem n. 357, de 8 de agosto de 2012, DOU - Seção 1 de 9-8-2012). (TJ-SC - MS: 20130465134 SC 2013.046513-4 (Acórdão), Relator: Cesar Abreu, Data de Julgamento: 11/03/2014, Grupo de Câmaras de Direito Público Julgado) (grifo nosso).

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