domingo, 23 de maio de 2010

POLÍCIA SEM CERIMONIAL

JORNAL FLIT PARALISANTE

GILMAR MENDES: “Não aposto muito em reforma constitucional para nova organização das polícias…Mas acredito que seja preciso definir que cabe à União dar os lineamentos de uma política de segurança pública”


REVISTA ÉPOCA | DEBATE
JUDICIÁRIO | STF – SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL                                                        Sáb, 22 de Maio de 2010.
ÉPOCA Debate: Precisa-se de um estadista
             A complexidade do tema segurança pode ser medida pelo contraste entre os números citados pelos três convidados do primeiro ÉPOCA Debate 2010 e a realidade das cadeias. Num país onde uma das maiores dificuldades é investigar e esclarecer crimes, as prisões continuam lotadas, com 130 mil pessoas a mais que a capacidade máxima.
             O ÉPOCA Debate é uma série de discussões promovida por ÉPOCA que pretende abordar alguns dos temas mais urgentes da agenda nacional. O vídeo com a íntegra da discussão sobre segurança está disponível em epoca.com.br/eleicao2010. Até outubro serão feitos outros quatro debates desse tipo, todos abertos à participação de leitores. Os próximos temas são saúde, política externa, educação e o papel do Estado.
             O debate da semana passada contou com a participação do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, do antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-secretário Nacional de Segurança Pública, e do diretor do Instituto Sou da Paz, Denis Mizne. Soares afirmou que só 1,5% dos homicídios no Rio de Janeiro é esclarecido. Mendes mostrou que em outras regiões a situação é pior. “Em Alagoas, constatamos que havia 4 mil homicídios registrados sem inquérito aberto”, disse. Depois de reclamar da enorme quantidade de projetos no Congresso que só tratam do aumento da punição para os que já estão presos, Mizne afirmou que a prioridade deveria ser dada aos que nunca são capturados. “Mais de 90% das prisões são flagrantes. Mostra que a investigação gera pouco resultado.”
           Os três chegaram a uma conclusão comum: o governo federal precisa assumir mais responsabilidades nessa área. “Tem de coordenar, assumir a liderança”, disse Mizne. “Segurança é questão de Estado”, afirmou Soares. “Concordo que há necessidade de uma diretriz nacional para o tema”, disse o ministro Gilmar Mendes.
              “Não aposto muito em reforma constitucional (para nova organização das polícias). Há espaço no texto constitucional para discutir isso (…) Mas acredito que seja preciso definir que cabe à União dar os lineamentos de uma política de segurança pública. Algumas palavras no texto constitucional dariam esse conforto institucional e espiritual”
“No Brasil nós temos de 470 mil a 480 mil presos, dos quais 44% são presos provisórios. São presos em flagrante, muitas vezes surpreendidos pelas ações policiais. Eles são então submetidos à Justiça. O juiz muitas vezes referenda o flagrante ou relaxa a prisão. Verificamos (por meio do mutirão carcerário, liderado pelo Conselho Nacional de Justiça) que havia presos provisórios de quatro anos, de cinco anos, de oito anos. Encontramos um no Ceará que havia 14 anos era preso provisório. Isso mostra que havia uma grave falha na Justiça criminal”
GILMAR MENDES, ministro do STF
               “Precisamos de uma agenda de segurança para o próximo governo. A União precisa assumir isso. Tivemos avanços nos últimos anos, mas ainda temos um índice alarmante: mais de 45 mil pessoas assassinadas por ano no país, 35 mil por arma de fogo. A centralização desse debate está nos Estados, onde a capacidade de investimento é baixa”
“A irracionalidade pauta muitas de nossas políticas. Há impunidade, claro, mas porque 98% dos homicídios não são esclarecidos. A discussão está no lugar errado. Só um pedacinho das pessoas que cometem crime é preso. Mais de 90% das prisões são flagrantes. Mostra que a investigação gera pouco resultado. Só é preso quem deu azar de cruzar com o policial quando estava cometendo o crime. Mas toda discussão sobre impunidade está em ampliar a punição desses poucos. Há 200 projetos no Congresso sobre pena maior, fim da progressão etc. A questão é o baixo índice de esclarecimento”
DENIS MIZNE, diretor do Instituto Sou da Paz
                  “O ciclo eleitoral é incompatível com o tempo de maturação de políticas públicas mais profundas. E o cálculo de todo gestor público que depende de mandato é o cálculo de quando ele vai colher os benefícios políticos do investimento. Na segurança, os resultados demoram para aparecer. Então isso é contra o cálculo da conveniência política”
                   “A questão policial é fulcral. E os candidatos ainda não se pronunciaram sobre isso. Nós herdamos da ditadura um modelo de polícia que é a nossa jabuticaba institucional. Temos de tratar delas. Ou elas serão instituições de aprofundamento da democracia, de garantia de direitos, ou o contrário disso. E o que acontece hoje? Rio de Janeiro: 7.854 mortos por ações policiais de 2003 a 2009. Campeão mundial disso. São números eloquentes: 65% são execuções extrajudiciais. Quem são as vítimas? Jovens e negros. Nos EUA, com 300 milhões de habitantes, são 300 a 350 mortos por ano em ações policiais”
LUIZ EDUARDO SOARES, antropólogo

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