domingo, 7 de julho de 2013

Algumas idéias para melhorar o combate à corrupção

jul 6, 2013 by   Fonte  ACERTO DE CONTAS
Por Claudio Ferreira
para o Acerto de Contas

Um dos pontos que chama atenção no atual momento político em que o país passa é o grande repúdio popular à corrupção.
Esse repúdio, no entanto, precisa materializar-se em ação política que exija a adoção de medidas concretas, que possibilitem a redução da corrupção no país.
Neste sentido, escrevo esse artigo para apontar algumas medidas que, a meu ver, podem tornar mais efetivo o combate à corrupção.
Antes de expor resumidamente algumas propostas, quero deixar claro que o combate à corrupção tem que passar necessariamente pelo ataque ao corruptor ativo e passivo, ou seja, deve enfrentar as duas faces da mesma moeda, o agente público e o privado que participam da engrenagem da corrupção.
Dito isso, sugerir medidas para melhorar o combate à corrupção passa necessariamente por analisar a atuação dos órgãos que são incumbidos de promover esse combate pelo nosso ordenamento constitucional, que são aqueles que desempenham uma das funções do Estado, a função de controle.
Essa função de controle, que é a base do combate à corrupção, é desempenhada pelos Tribunais de Contas, pelo Ministério Público, pela Polícia, pelo Banco Central, pelas Agências reguladoras, pelas Controladorias Internas dos Poderes e pelos órgãos fazendários responsáveis pelo combate à sonegação fiscal.
Veja-se que um dos aspectos que precisa ser enfrentado é que a função de controle está repartida entre vários órgãos, sem que eles atuem de forma coordenada. Cada um exerce a sua função sem contar com a colaboração obrigatória de informações que os outros órgãos de controle detêm.
O primeiro ponto, portanto, é exigir e garantir, mediante a edição de lei, que os órgãos de controle atuem de forma coordenada e que se institucionalize a permanente troca de informações entre eles. Não é possível mais admitir que as informações necessárias às investigações dos diversos órgãos sejam obstadas por esses próprios órgãos.
Não há explicação plausível para que, por exemplo, os Tribunais de Contas Estaduais não informem anualmente à Receita Federal quanto foi pago a cada uma das pessoas jurídicas pelos Estados e Municípios e que não recebam em contrapartida todas as informações relativas a essas mesmas empresas e os seus sócios, que a Receita Federal detenha.
Também não é aceitável que as informações relativas à movimentação financeira, incluindo a identificação da efetiva destinação do recurso que saem das contas bancárias dos Entes Públicos, sejam negadas pelo Banco Central aos Tribunais de Contas.
Outra questão, que aponta para a necessidade de uma atuação mais coordenada dos órgãos de controle, está na necessidade de se dar maior importância aos “erros” no processo licitatório. Sendo identificado um erro, que aponte na possibilidade de esse “erro” haver sido adotado para beneficiar a empresa que foi contratada decorrente desse procedimento licitatório, o Tribunal de contas deveria oficiar o Ministério Público, antes mesmo do julgamento das contas, para que fosse obtida judicialmente a quebra do sigilo bancário da empresa contratada, a fim de que se verifique a efetiva destinação dos recursos obtidos da execução do contrato público. Explicando melhor a razão da necessidade de adoção desse procedimento, há de forma meio direta uma relação entre a licitação dirigida ou viciada e o desvio de recursos públicos. Quebrando-se o sigilo da empresa beneficiária da irregularidade poder-se-ia verificar se de fato tal “erro” no processo licitatório foi apenas um erro formal, como costumeiramente alegam os agentes públicos, ou se tal “erro” ocorreu para possibilitar um desvio de recursos públicos, mediante o retorno desses recursos para o agente público ou para a “política”.
Há também a necessidade criação de indicadores de desempenho para todos os órgãos de controle apontados no início deste artigo.
Qual o desempenho dos órgãos de controle e quanto eles custam à sociedade?
Hoje o funcionamento de todos eles é uma caixa preta para a sociedade e precisa-se abrir o funcionamento desses órgãos para, através da elaboração, do acompanhamento e da análise de indicadores de desempenho, ser possível um acompanhamento social da atuação deles e, com isso, uma maior cobrança por eficiência na sua área de atuação.
Por último, um ponto que entendo ser central para o combate à corrupção é a implantação de uma causa para a perda do cargo público: a existência de sinais exteriores de riqueza incompatíveis com a renda e o patrimônio do agente público, como ilícito autônomo, independente da comprovação de ilícito anterior, transformando também esse fato em um ilícito penal específico.
Veja-se que, nesse caso, objetiva-se combater não só a propriedade obtida de forma ilícita, mas também o fato de se ter a posse ou usufruir de benefícios que não foram obtidos com recursos próprios. Essa medida é necessária para que se possa combater o uso dos tradicionais laranjas e os presentinhos tão comuns aos corruptos.
Já me deparei com certo político pernambucano em viagens pela Europa com estruturas e gastos de fazer inveja a reis e sultões.
Aqui sigo os ensinamentos do meu honrado pai que após longa carreira no serviço público – tendo ocupado vários cargos relevantes, diretor de Recursos Humanos da SUDENE, na gestão de Celso Furtado, Secretário Adjunto da Prefeitura da Cidade do Recife, Na gestão de Pelópidas da Silveira, Secretário Adjunto na Gestão Brizola, e que se aposentou como Procurador do Estado de Rio de Janeiro, cargo esse obtido mediante Concurso Público, com um patrimônio compatível com a sua remuneração- sempre me disse: quem desvia recursos públicos sempre deixa rastro na ostentação, pois nunca conheci alguém que desviou dinheiro público pensando na velhice, ao contrário sempre se desvia para esbanjar de imediato.
Não é mais possível tolerar que alguém vá para o serviço público com intuito de enriquecer e obter vantagens de forma irregular.
Neste caso, basta identificar sinais exteriores de riqueza incompatíveis com a renda e patrimônio, obtidos antes do ingresso no cargo público, para que seja possível a abertura de investigação necessária a apurar um ato ilícito, o enriquecimento sem causa, independentemente de haver sido praticado e provado qualquer outro crime. O só fato de alguém juntar patrimônio e usufruir de bens e serviços, no curso do desempenho do cargo público ou logo após, incompatíveis com a renda legalmente obtida, já deve ser razão suficiente para a perda do cargo e da aplicação de sanções penais, ou seja, precisamos ir além da previsto no artigo 9º, inc. VII, da Lei Federal 8.429/92.
Vislumbra-se neste caso a inversão do ônus da prova, cabendo ao agente público comprovar a sua idoneidade financeira. Há uma discussão muito forte na Europa atualmente, por conta da crise, de ser necessário também apenar o enriquecimento sem causa do particular, mas essa é outra discussão que podemos fazer em outro momento.
Para encerrar é necessário destacar que o sucesso do combate ao enriquecimento ilícito passa pela participação social. Para isso entendo que deva ser implementada a política de, no caso de abertura de apuração oriunda de informação fornecida por particular, destinar ao cidadão que forneceu as informações até 50% do valor da multa aplicada ao infrator, caso confirmada a denúncia formulada.
Haveria algumas outras sugestões que poderia apontar, que estou desenvolvendo na minha tese de doutoramento, mas fico por aqui para iniciarmos o debate sobre o tema aqui no Acerto de Contas.
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Cláudio Ferreira é advogado e foi Secretário de Assuntos Jurídicos da Prefeitura do Recife

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