Mexeram no placar!...
Na manhã do dia 23 passado, acordei-me com aquela impar voz rouca: “Paivinha amigo, parabéns. Só você, que conheço, pode ser nossa voz de repúdio público por esta podridão. É isso aí, hein? Não tem jeito, viu? Ladrões. Seu artigo está irretocável.” – no que agradeci com um chamado para um papo na FPF. Este era Carlos Alberto Oliveira (tal Fred), meu caríssimo amigo de muitas primaveras. Justo uma semana depois eu e todo mundo de gente na defesa do bem somos sacudidos por uma amargura. Fecham-se as cortinas dos estádios e apagam-se os refletores da bola. Desastradamente, alteraram o placar do jogo. Carlos foi embora para sempre, deixando-nos órfãos, por enquanto (sucesso Evandro), amantes do futebol da lisura. Era a esperança de termos um dirigente honesto à frente da CBF, sua marca registrada, botando ordem aos feitos malfeitos de Ricardo Teixeira. Seus arroubos conveniavam sua magnânima bondade através de seu coração largo – só quem o conhecia sabia de sua estrondosa lealdade. Lembro numa solenidade em Palácio, aberta por Luís Fernando Veríssimo, ele presenciou um diálogo meu com o palestrante ao fim do evento. Eu e o bochechudo escriba escrevíamos para o jornal da Pracinha (2000). E quando falávamos da corrupção desenfreada no País, Carlos endossou e mandou ao rompante: “Por que vocês dois não metem o pau nesses f.d.p, hein, hein?” Adeus Carlos Alberto, e continue a olhar, indômito, por nós inermes. Logo estávamos, eu e meu vizinho de página, irônicos, sacolejando o que restava de homens dignos a se rebelarem contra tudo que é miséria patente na maioria do Congresso. Vejam – em contas de agora, ontem, amanhã por certo! Absolveram a deputada Jaqueline Roriz, após ela ter confessado que havia recebido dinheiro “sujo” – ela era apenas uma cidadã e sequer candidata. O processo do “mensalão” prescreve já e o STF, ó, pitibiribas. Aguenta, Carlinhos? Bem, como Veríssimo na época, uma vez que ninguém paralisa o Brasil, melhor mexermos no placar. Cresce a revolta contra a corrupção. Talvez a encaremos errado. Tratamos como o lixo: queremos eliminá-la e esquecemos que é util. O lixo é vivo, orgânico e que dá energia. A vocação nossa para a corrupção também pode ser positiva se bem explorada. Se desejarmos séria a administração pública, elegeremos mais corruptos. Os candidatos seriam avaliados pelos prontuários e não pelos currículos, suas dicas eleitorais enfatizariam a falta de caráter deles e, uma vez eleitos, comparados seus dossiês, saberíamos quem teria mais poder e detiam mais verbas in governos. Todo o orçamento da União e dos estados iria diretamente para seus bolsos e contas dos apadrinhados – não precisa superfaturar, nem propinas, licitações arranjadas ou outras coisas que só atrapalham. Agora: os eleitos teriam de cumprir suas promessas de roubar muito. Seus únicos compromissos conosco seriam o de se manter fiéis à sua vocação e sempre desviarem dinheiro por baixo para a saúde etc. E sugeria nosso cronista que os recursos desviados, fraudulentos, aumentariam as verbas para o social. Quem não tirasse dinheiro público do seu bolso e o canalizasse para os gastos com o povo seria chamado de honesto, e até pior, pela Imprensa – e estaria politicamente liquidado. Ainda, como o saudoso Adilson Couto, “tem gente mexendo no placar”.
Rivaldo Paiva é escritor – E-mail: paiva.rivaldo@hotmail.com
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