terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Cruzada anticorrupção

9 de janeiro de 2010 | Categorias: 
Por Ricardo Stefanelli
Durante uma semana, permaneceu na capa do site de Zero Hora a seguinte pergunta:
“Você conhece algum político condenado por desvio de recursos públicos ou recebimento de propina que esteja, neste momento, atrás das grades?”
Até sexta-feira, 161 leitores, via internet, tentaram nos ajudar, aos quais agradecemos pela gentileza, mas ninguém conseguiu. Não havia como colaborar: não há ilustres nas cadeias do Brasil.
Indicadores conhecidos apontam a melhora da qualidade de vida no país, evolução nos quesitos de educação, solidez da economia e crescimento em infraestrutura, além do fortalecimento das instituições. A democracia judicial, porém, engatinha. Abarrotados de homicidas, ladrões e autores de outros crimes, os presídios permanecem à espera de corruptos. Olhem a resposta do juiz Carlos Eduardo Ribeiro Lemos, linha de frente no combate à corrupção no Espírito Santo, instado a nos fazer entender “por que figurão não cumpre pena de prisão”:
– Parece estranho um juiz dizer isso, mas acho que só vai para a cadeia quem não tem defesa. E isso só acontece com os pobres.
A íntegra da entrevista com Lemos, à página 6, faz parte de uma bandeira desfraldada hoje por ZH. Mais do que uma matéria jornalística iluminando o tema, lançamos um novo selo para identificar e estimular o debate sobre a impunidade. Sugiro cuidados extras, pois a reportagem, produzida por Leandro Fontoura, pode gerar irritação exagerada, frustração prolongada e aumento da sensação de impotência. Ao persistirem os sintomas, aliste-se nesta cruzada.
Como o risco de cadeia é pequeno, no país das oportunidades sempre vale a pena arriscar, em especial se se estiver fora da lei. O  historiador Marco Antonio Villa, da Universidade Federal de São Carlos, lamenta que cenas como a dos políticos de Brasília guardando dinheiro em cuecas e meias transmitam o recado, aos mais jovens, de que não é estimulante ganhar a vida com honestidade. A corrupção, não custa lembrar, se alimenta da impunidade.
No final de dezembro, ao ouvir o ministro da Justiça, Tarso Genro, se indignar com o fato de o Superior Tribunal de Justiça suspender o processo da Operação Satiagraha – Tarso disse que a decisão da Corte estimulava “a sensação de impunidade já existente no país” –, lembrei de uma entrevista de um ex-ministro da Justiça, nos anos 80, quando perguntado se em seu mandato como guardião do arcabouço jurídico do Estado a lei seria cumprida com rigor:
– O adjetivo é uma estaca na qual o substantivo, desmoralizado por tantos anos de inércia das autoridades, precisou apoiar-se para ser levado a sério – disse o então ministro Paulo Brossard de Souza Pinto.
O que mudou nessas duas décadas e meia?
Graças à liberdade de expressão garantida a partir de 1985, a imprensa pôde se debruçar, pelo menos, sobre os artifícios jurídicos que fortalecem a indústria da postergação. Parte deste processo, ZH tem tentado reforçar o caráter de vigilante da sociedade reservado aos meios de comunicação.
A bandeira do combate à impunidade se junta, a partir de hoje, ao Teste da Realidade, marca usada para colocar em xeque promessas de candidatos, às Ruínas do Século 21, série de reportagens que há dois anos denuncia o desperdício do dinheiro público em obras inacabadas, e ao já conhecido Placar dos Escândalos, símbolo criado para evitar a amnésia do que de pior a política nacional produz.

Nenhum comentário: