quinta-feira, 10 de maio de 2012

Você é a favor das cotas sociais? E das cotas raciais?


brasil_negro
Nas últimas semanas o debate sobre cotas raciais começou a ser fomentado, a partir de uma discussão do Supremo Tribunal Federal a respeito sobre a legalidade do processo utilizado na UNB.
Não gosto de tomar posicionamentos partindo do pressuposto apenas por questões legais pois é preciso antes de tudo perceber a eficácia econômica e social das medidas tomadas.
Durante a eleição de Reitor da UFPE defendi a adoção de cotas sociais no ingresso na universidade, como forma de reduzir a enorme disparidade entre escola pública e privada.
Só para situar o debate, na UFPE existe uma bonificação de 10% sobre a nota dos alunos oriundos da escola pública, que é uma distorção que apenas serve para o Governo ficar dizendo que os primeiros lugares no vestibular saíram da escola pública, e para falar que melhoraram a educação pública, o que qualquer energúmeno sabe que não é verdade. Esse sistema de bônus, no fundo, é uma esmola a quem precisa de reconhecimento. Minha proposta era reservar um percentual por curso para oriundos de escola pública. Desta forma, garante-se o acesso em cursos muito concorridos, como Medicina, Direito e afins.
Essa breve introdução é apenas para saberem qual foi minha posição.
Para começar a pensar nas cotas, é preciso ter alguns pressupostos importantes.
  1. Reservar vagas para alunos é uma aberração justificável. Uma aberração porque mostra nossa completa incompetência com a educação pública. Estamos tentando resolver por cima, quando deveríamos resolver por baixo.
    Mas isso se justifica porque há um urgente déficit social a ser resolvido, e não adianta pensar que em poucos anos irão melhorar substancialmente a escola pública.
    Isso não vai acontecer tão rápido. Todos os Governos, TODOS, trataram educação como lixo. O salário dos professores é uma porcaria, a ineficiência gerencial é grande e as escolas estão aos pedaços. Então falar em melhorar a educação pública antes de oferecer algo a quem teve de se submeter a esta bagunça é brincar de fazer política social e condenar toda uma geração à pobreza.
    Dentro dessa perspectiva, as cotas sociais se justificam, mas não devem ser permanentes. Deveria ter uma transição, até que as notas médias entre alunos de escola pública e privada se equiparassem.
  2. Cotas raciais também se justificam
    Um trabalho antigo, porém seminal até hoje, conduzido pelo economista sueco Gunnar Myrdal, tratava das desigualdades entre brancos e negros americanos, e as ações afirmativas.
    Myrdal escreveu na década de 40 o livro An American Dilemma: The Negro Problem and Modern Democracy, e na década de 60 estendeu seu raciocínio em Economic Theory and Underdeveloped Regions.
    Myrdal, que ganhou o Prêmio Nobel de Economia em 1974, desenvolveu o chamado Princípio da Causação Circular e Acumulativa.
    Seu raciocínio servia para os negros e para países também. Inclusive já falei sobre isso aqui no Acerto de Contas.
Segundo Myrdal, um país era pobre simplesmente porque era pobre, assim como o negro. O negro nascia pobre, não conseguia se alimentar e educar adequadamente, e não conseguia sair do círculo vicioso chamado por ele de Príncipio da Causação Circular.
Desta forma, era preciso uma ação econômica externa capaz de romper este círculo vicioso. Não se pode condenar eternamente um povo, ou mesmo um país, à pobreza.
Por este raciocínio se justificam as ações afirmativas.
No caso brasileiro das cotas raciais nas universidades, podemos encarar o problema de duas formas: colocando o indivíduo pobre como vítima, ou colocando um grupo de indivíduos pobres ou negros como vítima do sistema.
Se encararmos que a Universidade é uma forma de fazer justiça social, apenas as cotas sociais se justificam, já que estamos dando a oportunidade às pessoas pobres de estudarem em uma universidade pública, e melhorarem suas possibilidades empregatícias futuras.
Se encararmos a Universidade como uma forma de fazer justiça social com eficiência econômica, o correto seria pensar em grupos de indivíduos que precisam ser atendidos. Desta forma, tanto os pobres como os negros deveriam ser atendidos separadamente, já que são grupos excluídos de formas diferentes.
Talvez a definição não seja a mais clara, mas foi a que consegui pensar no momento.
Por um lado você rompe o círculo vicioso em que o negro está submetido pela sociedade e oferece a ele a oportunidade de ascender economicamente via educação. E se considerarmos que são excluídos pelo fato de serem negros, ao criarmos ações afirmativas, estamos aumentando a eficiência econômica ao intervirmos.
american blackO grande problema está no fato de que a maioria dos negros são pobres, então há uma dificuldade nossa em aceitarmos que um negro pobre teria mais dificuldade na vida que um branco pobre.
Dada a enorme correlação entre negros e pobres, creio o resultado do vestibular não apresentaria diferença significativa caso fosse criada uma cota específica para negros. No fundo criaria algumas diferenças pontuais que só ofereceriam argumentos para os mais conservadores criticarem as cotas.
Mas como disse, isso seria apenas uma crença. Não tenho números para discutir a eficiência disso.
De qualquer forma, não é um debate fácil.
E você pode estar pensando: mas o vestibular é uma forma de justiça, onde os melhores entram.
Mas hoje só há justiça para as classes média e alta, que podem pagar cursinhos caros e poderiam se virar muito bem em faculdades privadas.
Só que nesta esquizofrenia chamada educação brasileira, enquanto o filho do ricaço vai estacionar seu carrão na universidade pública e gratuita, o pobre trabalha o dia todo e pega o busão para estudar na faculdade privada e paga.

 Pierre Lucena    Sem Comentários    Postado em: Educação

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