Por Rodolfo Araújo
para o Acerto de Contas
Dia desses peguei um já iniciado debate sobre Burocracia e Corrupção, que trazia em seu enunciado o vídeo reproduzido acima.
A questão era: “Situações como a dramatizada no vídeo existem para induzir a corrupção, ou é a corrupção que induz a isso, ou corrupção não tem nada a ver com isso?”
O tema é suficientemente provocante, embora estejamos tratando de dois assuntos diferentes que o brasileiro adora misturar, para justificar seus próprios desvios.
De um lado está a desigualdade que o serviço público gera, com seus salários fora dos padrões de mercado, a indecente aposentadoria integral e a inadministrável estabilidade, que os condena precocemente à estagnação. Neste cenário, nascem personagens como o senhor do vídeo, mais preocupado em se livrar do trabalho do que em atender seu público – que é, na realidade, seu patrão.
Junto a isto, vemos o papel excessivamente controlador do Estado, apoiado em práticas burocráticas que, em tempos de Internet, home banking, scanners e certificados digitais, não têm mais razão de existir. Persistem apenas para manter um contingente de funcionalismo público que atende a fins puramente eleitoreiros.
Economias muito controladas são, historicamente, as mais corruptas. Vide Rússia e China. Nestes casos, creio que o sistema leva à corrupção. O que não significa, entretanto, que seja uma relação rígida de causalidade, já que há países com economias muito controladas mas pouco corruptas e, outras, pouco controladas mas muito corruptas.
O caso brasileiro, contudo, é diferente. Para entender, é preciso combinar ambos os cenários descritos acima.
Do outro lado, está alguém que quer criar dificuldades para vender facilidades. Perto dele – e, principalmente, dependendo dele – está alguém que não quer dificuldades, porque acha que sempre pode dar um jeitinho. Corrupto e o corruptor, respectivamente. Duas figuras desavergonhadamente atadas, visceralmente dependentes uma da outra.
Se você me perguntar, acredito que no Brasil há mais corruptores do que corruptos. O segundo só existe se o primeiro existir – e não o contrário. Para termos mil policiais corruptos é preciso haver um milhão de corruptores (chute).
Corrupto é o outro
A moça do vídeo é exatamente o antídoto da corrupção – e, infelizmente, é um personagem que não existe no país do despachante, no reino do serviço público loteado, na republiqueta do malandro.
Já travei batalhas semelhantes em busca do carimbo perdido, do selo mitológico e da autenticação prometida, em repartições onde os funcionários não disfarçam o desapontamento quando você ultrapassa o último obstáculo.
O problema é que o brasileiro acha plenamente justificável ser o corruptor quando ele (acha que) está certo. Ele (acha que) pode beber duas latas de cerveja, então suborna o guarda da Lei Seca. Ele acha que tem muita burocracia, então paga para passar na frente. Ele não questiona a Lei enquanto instituição, mas enquanto algo que o prejudica, pessoal e individualmente.
Jamais imagina que se ele fizer tudo o que a Lei pede (como todos), observando os prazos (que são para todos), a máquina da corrupção tende a quebrar. Só que, assim como no Dilema do Prisioneiro, ele não quer dar o primeiro passo. Mas, de acordo com a Teoria dos Jogos, a melhor solução individual é a pior solução coletiva – e isto é cíclico, ou seja, volta-se contra ele, eventualmente e de forma implacável.
Concluindo, entendo que no Brasil a enorme burocracia sugere a corrupção – e a sugestão é aceita de muito bom grado por um povo imensamente preguiçoso e confortavelmente corrupto. Mas a culpa é sempre do outro.
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