Por Flávio Moreira*
Um dos desafios de qualquer governo (e não será diferente no próximo) é exatamente a política de segurança pública. Os indices de criminalidade crescem assustadoramente e as estatísticas existentes, por mais falhas e maquiadas que sejam, ainda assim demonstram a evolução da impotência do estado versus o crescimento da audácia dos criminosos.
Praticamente todos os dias, os meios de comunicação noticiam homicídios, assaltos a bancos, latrocínios e outros tantos crimes que não eram nem um pouco comuns há alguns anos atrás. Enquanto os criminosos se organizam cada vez mais, tomam conta de comunidades inteiras e chegam ao ponto de “cuidar” das entradas de “sua” comunidade com sistema de câmeras, o aparelho estatal se vê impotente exatamente pela completa falta de noção dos gestores da segurança pública do estado.
É senso comum que somente polícia não resolverá o problema da criminalidade seja aonde for, mas me digam vocês se uma polícia, com um efetivo que deveria ser no mínimo o dobro dos que estão na ativa, pode enfrentar o tráfico de entorpecentes com uma Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE) que conta com 5 agentes, 1 delegado e 1 escrivão? Todos os estudos apontam para uma relação de cerca de 80% dos casos de crimes violentos com o tráfico de entorpecentes e aí se fecha o primeiro elo da fórmula!
Combater o tráfico de entorpecentes, de maneira eficiente, significa tirar da criminalidade a sua principal fonte de renda e assim diminuir consideravelmente o tráfico de armas, o aliciamento de menores e os próprios homicídios, que em grande parte são de viciados que não pagaram suas dívidas ou de trabalhadores do tráfico que quiseram ser mais espertos que os chefes.
O segundo elo é promover uma verdadeira aproximação da sociedade com os policiais, dentro não só do conceito de polícia comunitária, mas principalmente seguindo à risca o objetivo de uma segurança cidadã. O que ocorre hoje é que as pessoas, por não confiarem na polícia, passam a evitar o contato com os policiais (salvo se conhecerem algum ou tiver um na família) e aí fica praticamente impossível obter informações acerca de determinado crime, quando reina a lei do silêncio.
Ora, além do justificável medo de prestar uma informação sem a garantia de que a fonte será mantida em sigilo (tem delegado que faz questão de “botar no papel”), há ainda a desconfiança de que aquele policial e sua equipe estejam envolvidos com o crime. Logicamente, sabemos que 98% dos policiais são verdadeiros heróis, mas os 2% corrompidos são como um câncer que se espalha na sociedade e dentro da própria corporação.
Um instrumento interessante e que pode vir a dar certo, são as plenárias comunitárias realizadas com a presença de gestores da segurança e profissionais responsáveis pela respectiva área circunscricional. Nessas plenárias, a comunidade pode apontar as necessidades da região como maior número de viaturas, maior quantidade de rondas, enfim, sugerir ações que norteiem o planejamento para a sua comunidade.
Só que nessas plenárias, certamente haverão pessoas “infiltradas” da própria criminalidade e por isso haverá sempre o medo de falar tudo o que se sabe e que precisaria ser falado. Por isso, é necessário que um serviço como o disque denúncia da Polícia Civil (147) funcione de verdade e seja divulgado para que toda a população tome conhecimento. Em sendo um número de discagem gratuita, todas as camadas da sociedade poderão acessá-lo e a garantia de anonimato deve ser preservada a todo o custo.
Finalmente, o terceiro elemento e certamente o mais importante é o homem, o policial. De nada adiantará investir nas ações acima elencadas se não tivermos homens motivados e preparados para a repressão qualificada ao crime. Todos nós sabemos que as remunerações dos policiais deixa por demais a desejar, o que na maior parte das vezes o obriga a ter outra atividade (o famoso “bico”). E ninguém consegue se dedicar de corpo e alma ao seu trabalho, com contas atrasadas, família passando dificuldade, cobradores na porta e demais situações comuns à quem ganha pouco.
É óbvio que não dá para corrigir a defasagem histórica da remuneração dos policiais com um toque de mágica, mas é preciso estabelecer metas e uma política remuneratória para médio prazo, que consiga assegurar o mínimo de dignidade a quem sai de casa arriscando a vida para defender aqueles que nem conhece. Na Paraíba, assim como na maior parte do Brasil, esse paradigma precisa ser urgentemente quebrado e as “republiquetas” dos oficiais e dos delegados, precisa ser imediatamente revista e revisitada.
Nos últimos vinte anos, com ênfase para os últimos oito, foram concedidos reajustes consideráveis aos que comandam as polícias. Já os que executam de fato as atividades policiais (praças e agente policiais), contentaram-se, se muito, com os mesmos índices percentuais dos que comandam as instituições, o que aplicado aos baixos salários, dá quase nada. Os “chefes” mantiveram seu discurso de “colaborar com a segurança pública, servir ao cidadão”, porém qual foi o resultado prático nas corporações policiais?
Os “chefes” não fazem o trabalho dos “chefiados” e estes, insatisfeitos, com um risco muitas vezes maior para sua própria vida, continuam com os problemas financeiros e mais ainda, com o novo problema causado pela discriminação: auto-estima baixa. Será que alguém em sã consciência pode aceitar que um delegado de polícia, recém nomeado, receba praticamente R$ 8.000,00 (oito mil reais), com as vantagens do cargo e que um policial civil, com mais de 20 anos de serviço, vá para a rua, investigar satisfeito, arriscando sua vida, para ganhar menos de R$ 2.000,00 (dois mil reais)?
Certamente virão os que dirão: “ah…mas são os requisitos de investidura, a complexidade do cargo”. O pequeno detalhe é que hoje a polícia civil é toda formada por profissionais de nível superior, ou seja, só se entra nela com ao menos uma graduação! Por tudo isto, é chegada a hora de se rever as políticas remuneratórias nas corporações, porque caso contrário, o sistema não funcionará.
Porque na verdade, em um país como o Brasil, único no mundo que adota o atual modelo de inquérito policial, sempre haverá um “jeitinho” dos insatisfeitos não trabalharem. É como ouvimos na instituição: “o estado finge que me paga e eu finjo que trabalho”. E o pior é que os nossos filhos, pais, mães, demais familiares e amigos é que estão lá fora pagando esta conta. E sabem o que alguns chefes dizem e outros pensam? “Se quiser ganhar bem, faça concurso para o meu cargo”. Traduzindo: “dane-se a segurança pública, a sociedade e meus empregados”. Eles estando bem, o resto que se exploda. E os caixas eletrônicos continuam a ser explodidos…
Pagando muito pra quem faz pouco e pagando muito pouco para quem poderia fazer muito. Não há mistério, é contabilidade pura e simples. Para combater a criminalidade é adotar as medidas que citamos acima e valorizar os que não foram valorizados até agora. Se a outra estratégia não deu certo (a de agradar os chefes), porque não tentar um novo caminho? Na Polícia Federal, no Distrito Federal, em Sergipe, no Paraná e em todos os locais que houve valorização da base das carreiras, deu certo e a eficiência policial aumentou.
Que tal tentarmos na Paraíba? Em 6 meses, já iremos colher os primeiros frutos. Não há, até o momento, nenhuma fórmula para o sucesso. Mas certamente, alguns ingredientes precisam ser mudados e experimentados novas receitas, já que o que aí está definitivamente não vem dando certo!
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