quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Minha Evocação do Recife

Escritor:
Rivaldo Paiva escritor

Recife. Não a cidade nassoviana dos armadores das índias ocidentais. Não o Recife dos mascates, das revoluções libertárias, da Rua da União de dona Aninha Viegas e do fogo lá em Santo Antônio – claro, aquele do alumbrado mestre Manuel Bandeira e da casa do seu avô.
Mas o meu Recife praieiro, veneziano, de pontes românticas ornando rios de peixes, sombreados por mal assombrados casarios coloniais a margearem sonhos despertados dos seus filhos insurretos.
O Recife poético do príncipe Olegário, inspirador das rimas irreverentes de Ascenço Ferreira, dos trezentos desejos interrompidos de Carlos Pena Filho, da magia calculada de Joaquim Cardozo, das arraigadas vidas severinas de João Cabral de Melo Neto. O Recife cultural e histórico de Pereira da Costa, Nabuco, Oliveira Lima e Gilberto Freyre – de Ariano, dos Oliveiras de Valdemar, de Mauro Motta, de Tomás Seixas, Hermilo Borba, Orlando Parahym, Nilo Pereira e Renato Carneiro Campos.
Ah, o Recife de saudosos carnavais de papangus, caboclinhos e maracatus – do Pão Duro, Canindés, Andaluzas, Madeiras, Lenhadores e Batutas de São José! De outras evocações de Nelson Ferreira e Antonio Maria – selando a volta de Luís Bandeira, sob os acordes sentimentais das canções de Capiba.
Recife, cidade lendária... Das belas manhãs de vassourinhas aos talcos e lanças perfumando o ar de uma Guararapes enfeitada de confetes coloridos de saudades, sacudida pelo frevo rasgado a partir dos frontispícios respingados do chope gelado do Savoy – sons de clarins de Momo, surrupiados e desafinados, arretando os sábados de Zé Pereira!...
Recife do futebol clássico e de craques dos clássicos bonitos de se ver, numa salada de arte única dessa mágica diabrura brasileira.
Recife das vitrines vistosas das ruas Nova e Imperatriz, do cais da Rua da Aurora, dos passeios de bondes e lotações até o Derby, Casa Forte, Torre e Madalena e Caxangá – banhos em Boa Viagem, visitas à Boa Vista.
Meu Recife do glamour de uma sociedade mais classe média, mais maioria, que sempre guiou e formou a opinião sensata das outras classes sociais, com a melhor qualidade e discernimento. Ricaços eram poucos. E os mais pobres se confundiam com o bem-estar respeitoso e elegante, guardando-se as épocas.
Esse o Recife que conheci pelos livros, jornais, e pela vivência testemunhal das histórias de Troncoso e reais contadas pelos nossos avós, cordéis e manés de barbearias em borracharias, feiras-livres e meios-fios das calçadas da minha infância. E nunca mais parei de cascavilhar ou fuçar causos nos recortes e cartas ainda cheirando longe à flor de colônia em baús fechados – mascarados pelo pó espirradeiro do esquecimento.
Recife das mal-querências que não se sabiam se havia. Mas, o orgulho de aqui se nascer, viver com a família e lutar pela grandeza da nossa cidade sempre foram bens valiosos e intocáveis... Querem saber de uma coisa?...
Podem acabar com tudo que mereça grandeza econômica e social. Que apareçam as rafaméias políticas para derrotar a invisível escada de metrópole. Agourem, por oportuno, até nas politicagens e na elite iletrada, ou podem pensar que não há crescimento na vida... Tudo enfim!... – mas, conservemos a nossa cidade pequena e decente. Da sua tradição guerreira e do seu berço cultural que ainda contamina o Brasil.
Amei e amo o Recife

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